Publicação: quinta-feira, 9 de maio de 2019
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância
Campo Grande, Ano XIX - Edição 4256
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citação dos réus. À fl. 51, o Oficial de Justiça certificou que o atual ocupante do imóvel é a pessoa de Antonio Roberto Borges,
o qual reside no imóvel há 01 (um) ano, sendo o mesmo citado acerca da presente ação. Citação pessoal de Carlos José da
Silva à fl. 56. A pessoa de Antonio Roberto Borges apresentou contestação às fls. 58/120, alegando, preliminarmente, a
existência de irregularidade no pólo ativo da demanda, uma vez que não há informações de que ainda está em andamento o
processo de inventário de Gillman H. José Jorge Farah. No mérito, alega a usucapião como matéria de defesa, afirmando que,
somando-se as posses anteriores, cuida do imóvel há mais de 15 (quinze) anos, residindo no local com sua família e promovendo
cultivo de subsistência na área, de maneira mansa e pacífica, sem que houvesse oposição do requerente ou de qualquer outra
pessoa, tratando-se de posse de boa-fé. Ressalta que realizou benfeitorias no imóvel, e em razão disso, possui direito de
retenção do imóvel e indenização. Requer a improcedência do pedido autoral e, por conseguinte, seja declarada a aquisição da
propriedade do imóvel, pela prescrição aquisitiva da totalidade do bem, servindo a sentença de título para registro e devidas
averbações. Em caso de entendimento diverso, requer seja reconhecido o direito de retenção do imóvel e seja ressarcido pelos
gastos efetuados com benfeitorias no local. Também pugna pelas benesses da justiça gratuita. Réplica às fls. 155/163. Intimados
a indicarem as provas que pretendiam produzir, Antonio Roberto Borges pleiteou pela prova pericial, depoimento pessoal do
autor, documental e testemunhal (fls. 170/172) e o autor pugnou pela prova testemunhal, pela desistência da ação em relação
ao réu Alexandre Rodrigues Pereira e pela inclusão de Antonio Roberto Borges no pólo passivo da demanda. À fl. 179,
determinou-se a inclusão de Antonio Roberto Borges no pólo passivo da demanda. Na mesma ocasião, homologou-se a
desistência da ação em relação ao réu Alexandre Rodrigues Pereira. À fl. 185, certificou-se a inércia do réu Carlos José da Silva
em apresentar contestação. O feito foi saneado às fls. 186/190, ocasião em que se decretou a revelia do réu Carlos José da
Silva, contudo sem aplicação dos efeitos da mesma, vez que trata-se de ação com pluralidade de réus. Afastou-se a preliminar
de ilegitimidade ativa e foram fixados os pontos controvertidos. Designou-se audiência de instrução e julgamento e deferiu-se a
prova documental. Manifestação do autor à fl. 201, na qual pugna pela juntada dos documentos de fls. 202/208. A parte ré foi
intimada acerca de tais documentos à fl. 210. Manifestação do réu Antonio às fls. 218/219, na qual apresenta rol de testemunhas,
tendo o Cartório certificado a intempestividade de seu pleito à fl. 220. Na decisão de fls. 227/228, indeferiu-se o rol de
testemunhas apresentados pelo réu Antonio, por ser o mesmo intempestivo. Redesingou-se a audiência de instrução e
julgamento. As partes, à fl. 242, noticiaram que realizaram negócio jurídico processual e que entenderam que o feito admite
julgamento no estado em que se encontra. Anotou-se que o autor desistiu da prova testemunhal e que o réu desistiu do
depoimento pessoal da autora. À fl. 244, homologou-se o negócio processual entabulado pelas partes. Determinou-se a
intimação do réu para que informasse se ainda tinha interesse na produção de prova pericial. À fl. 248, certificou-se a inércia da
parte ré. Relatados. Decido. Trata-se de Ação Reivindicatória movida por Espólio de Gillman José Jorge Farah, representado
por sua inventariante Lor Moukarzel Farah, em face de Antonio Roberto Borges e Carlos José da Silva, todos já qualificados nos
autos. O feito admite o julgamento no estado em que se encontra, nos termos do art. 355, I, do CPC, uma vez que as partes, às
fl. 242, desistiram da produção de prova oral (o que foi homologado à fl. 244), e porque o réu, apesar de devidamente intimado
(fl. 245), não ratificou o interesse na prova pericial, conforme certidão de decurso de prazo de fl. 248. 1 Do Réu Antonio Roberto
Borges Trata-se, pois, de pretensão reinvindicatória fundada no domínio da coisa, nos termos do artigo 1.228 do Código Civil
que assim estabelece: “Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do
poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.” Com efeito e nos termos do art. 1.228, do CC/02, é sabido que a
ação reivindicatória, de natureza real, dominial ou petitória, compete ao proprietário não possuidor da coisa para reavê-la do
poder de terceiro, possuidor não proprietário, que injustamente a detenha. É o que diz o E. TJMS: “APELAÇÃO CÍVEL AÇÃO
REIVINDICATÓRIA CUMULADA COM PERDAS E DANOS PRELIMINAR DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE
AFASTADA PRELIMINAR DE OFENSA À COISA JULGADA AFASTADA AUSÊNCIA DE PROVA DO DOMÍNIO REQUISITO DA
AÇÃO REIVINDICATÓRIA MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ ART. 17 E 18, DO CPC/73 ATO TEMERÁRIO OMISSÃO DA
VERDADE DOS FATOS MULTA MANTIDA RECURSO DESPROVIDO. (...) A admissibilidade da ação reivindicatória, que
compete ao proprietário não possuidor contra o possuidor não-proprietário, depende da prova da titularidade do domínio, da
individuação da coisa e da posse injusta pelo réu, requisitos não comprovados nos autos (...)” (TJMS AC 083372087.2015.8.12.0001 1ª Câmara Cível Rel. Des. Marcelo Câmara Rasslan Julg. 14/02/2017).” Nota-se, portanto, que o êxito do
pleito reivindicatório está subordinado à satisfação de três requisitos elementares: a individualização da coisa, o domínio do
autor e a posse injusta do réu, o que ocorreu, impondo-se a procedência do pedido, conforme razões expostas a seguir. O
primeiro requisito, consistente na individualização da coisa, restou devidamente demonstrado nos autos, uma vez que já na
inicial a parte autora individualizou o imóvel objurgado, o qual encontra-se localizado no Lote 08, da Quadra 50, Jardim Aero
Rancho, nesta Capital, cujas limitações e medidas estão descritas na matrícula de fl. 15. O segundo requisito referente a
propriedade do bem, também foi devidamente comprovado no feito, pois a matrícula de imóvel de fls. 15 demonstra que o bem
litigioso foi adquirido pelo de cujus Gilman José Jorge Farah, na data de 12/08/1983, sendo que com a morte da referida pessoa,
a legitimidade para discutir a propriedade do bem passou a ser de seu espólio, nos termos do art. 110, do CPC e art. 1791, caput
e § único, do Código Civil, restando evidenciada a legitimidade para a propositura da presente demanda. No que tange ao
terceiro requisito, tem-se que para saber se a posse exercida pelo réu é justa ou não, impõe-se a análise do art. 1.200 do
Código Civil, o qual dispõe que: “É justa a posse que não for violenta, clandestina ou precária”. Diante da singeleza do dispositivo
legal, são oportunos os esclarecimentos da doutrina de Orlando Gomes: “Posse justa é aquela cuja aquisição não repugna ao
Direito. Para ter essa qualidade, o que importa é a forma da aquisição. Se foi adquirida por um dos modos admitidos na lei, a
posse terá esse predicado. Justa é, por conseguinte, toda posse cuja aquisição for conforme ao direito. Em termos mais
concretos, a posse é justa quando isenta de vícios originais. Os vícios objetivos que maculam a posse são: a violência, a
clandestinidade e a precariedade. Desde que seja adquirida sem qualquer desses vícios, a posse é justa. [...] Posse violenta é
a que se adquire pela força. Obtém-se pela prática de atos materiais irresistíveis. [...] Posse clandestina é a que se adquire às
ocultas. O possuidor a obtém usando de artifícios para iludir o que tem a posse, ou agindo às escondidas. [...] Posse precária é
a que se adquire por abuso de confiança. Resulta, comumente, da retenção indevida de coisa que deve ser restituída”. (Grifouse) Feitas essas considerações preambulares, e analisando as provas produzidas nos presentes autos, de rigor reconhecer que
a posse exercida pelo réu Antonio Roberto Borges é INJUSTA, pois foi adquirida com vício originário (clandestinidade), vez que
este ingressou na posse do imóvel, sem que o verdadeiro proprietário (no caso o espólio autor) tivesse ciência ou dado
autorização, impondo-se a procedência do pedido em relação ao referido réu. Destaca-se que o instrumento particular de
cessão de crédito por sub-rogação de fls. 125/126, não se mostra hábil para evidenciar a posse justa do réu, porquanto trata-se
de contrato firmado com terceira pessoa (Alexandre Rodrigues Pereira), sem que houvesse qualquer anuência expressa da
parte autora quanto ao negócio ali firmado, deixando claro que o réu ingressou na posse do imóvel, sem que tivesse justo título
para tanto. Ademais, caberia ao réu, ao pretender adquirir o referido imóvel, diligenciar junto ao Cartório de Imóveis para
verificar a situação do mesmo e apurar quem era seu real proprietário, o que não ocorreu, tendo este assumido o risco de
adquirir imóvel de pessoa que não detinha poderes para tanto, não havendo que se falar, portanto, em posse justa e de boa-fé.
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º.