Disponibilização: sexta-feira, 8 de maio de 2020
Diário Oficial Poder Judiciário - Caderno Jurisdicional - Primeiro Grau
Maceió, Ano XI - Edição 2581
272
Toda pessoa acusada de um delito terá direito a que se presuma sua inocência enquanto não for legalmente comprovada a sua culpa.
Art. 8º. § 2º Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente a sua
culpa. (grifos nosso). Assim sendo, é que, como bem afirmou NELSON HUNGRIA, condenar um possível inocente é mais traumático do
que absolver um possível culpado, razão pela qual se impõe a absolvição do ora acusado no delito em questão. DO CRIME DE
ESTELIONATO QUALIFICADO EM FACE DA VÍTIMA LEONTINA ALVES DA SILVA. A prova da materialidade do crime constante nos
autos, resume-se aos depoimentos prestados na fase inquisitiva. Ressalte-se que os documentos colacionados nos autos dão conta das
existências dos ilícitos de estelionato, tendo como ponto principal a venda de um segundo imóvel (terreno/armazém) sem o consentimento
da Sra. Leontina Alves da Silva, porém não confirmado para a vítima apontada nestes autos. Quanto à autoria, entendo não existir
elementos convincentes que apontem em direção ao réu. No que pertine a autoria do crime, não há nos autos prova cabal e suficiente a
ensejar uma condenação, haja vista que as provas produzidas na fase judicial, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, não
confirmaram a autoria do delito para o denunciado. Vejamos: Leontina Alves da Silva (vítima), em seu depoimento, afirmou, em apertada
síntese, que seu filho João não a ameaçou e/ou a maltratou; Que João era quem administrava seus bens após o falecimento de seu
marido; Que João foi desleal com ela; Que João vendeu os imóveis e não repassou nenhum dinheiro pra ela; Que João comprava as
coisas com o dinheiro dela. Claudionor Iziodoro Alves (testemunha): Que não houve ameaça cara a cara, mas o réu falou para a irmã
Cledja que se houvesse qualquer coisa com ele não ia pagar sozinho, iam dois ou três, entendo assim, que seria o depoente, Claudis e
a Cleonice; Que após o falecimento de seu pai, João ficou administrando o patrimônio de sua mãe; Que soube que sua genitora tinha
autorizado o acusado João a vender um armazém, contudo, este vendeu dois armazéns pelo valor de 1 (um) milhão de reais; Que soube
que João não repassou nenhum valor para sua mãe, apenas dava o valor de R$ 250,00 por semana a sua genitora; Que soube que
desse dinheiro foi adquirido um automóvel e uma casa para a pessoa de Cledja, irmã adotiva, no valor aproximadamente de R$
300.000,00 (trezentos mil reais); Que houve inventário dos bens deixados pelo seu genitor; Que após a venda dos armazéns o réu João
passou a administrar os pagamentos das despesas da Sra. Leontina; Que o réu João retirou sua genitora de sua residência e a colocou
na casa da irmã deles, Cledja. Que com essa mudança, aos poucos, deixou de visitar a sua genitora. Cleonice Alves da Silva (testemunha):
Que não a ameaçou pessoalmente a depoente; Que o réu João retirou sua genitora de sua residência e a colocou na casa da irmã deles
de criação, Cledja; Que Cledja disse para depoente que o réu falou: se ele caísse, cairia dois ou três; Que um determinado tempo a
Cledja passou a administrar os bens da Sra. Leontina, com os aluguéis dos imóveis; Que soube que seu irmão João vendeu dois imóveis
de sua mãe, um com consentimento desta e o outro não; Que ouviu falar que o valor das vendas foi de 1 (um) milhão de reais; Que a
casa adquirida para a irmã da depoente, Cledja, antes da negociação do imóveis pelo réu João, foi o motivo pelo qual fez o réu se afastar
da família por um período de tempo; Que tem conhecimento que foi adquirido um veiculo zero km para sua irmã Cledja com o dinheiro
da venda dos imóveis; Que o réu disponibilizava apenas o valor de R$ 250,00 por semana; Que a casa em que vive a Sra. Leontina e a
Cledja é a casa que entrou no negócio da venda dos imóveis pelo João; Que Cledja recebia ordem do réu João, o qual tinha dito a Cledja
que proibisse a depoente de visitar sua genitora, a Sra. Leontina. David Ewerton Medeiros Lino (testemunha): Que é casado com uma
das netas da Sra. Leontina; Que um determinado dia estava saindo de seu local de trabalho de moto e de repente viu um carro
encostando-se à sua traseira em alta velocidade, buzinou e evadiu-se. Posteriormente descobriu que se tratava do veículo do acusado
João; Que tem conhecimento que quem administrava os bens da Sra. Leontina era ela própria, pois era lúcida; Que recorda de ter visto
a Sra. Leontina autorizando o réu João a vender um imóvel com o objetivo de com o dinheiro se manter e arcar com suas despesas; Que
tem conhecimento que foi vendido o referido imóvel; Que depois ouviu falar que o réu João vendeu dois imóveis; Que ouviu comentários
que o réu tinha dito que se acontecesse alguma coisa com ele, ele não iria só, iria mais dois ou três; Que quando começou a se
relacionar com a neta da Sra. Leontina não conhecia a pessoa de João. Cledja Alves da Silva (testemunha): Que seu irmão João falou
que se entrassem na justiça ele derrubaria dois ou três; Que a referida ameaça foi feita após terem descoberto que o João tinha vendido
o segundo armazém quando tinha sido autorizado pela Sra. Leontina apenas um armazém; Que o réu abandonou sua genitora em
relação ao fator financeiro; que quem administrava os bens e recursos da Sra. Leontina era o João; que nunca pediram para João fazer
prestação de contas sobre a administração dos bens; que recebeu de presente da sua genitora um carro novo; que sua genitora pediu
para o João vender um armazém para comprar um carro e uma casa para a depoente; que o João depositava apenas o valor de R$
250,00 por semana; que a Sra. Leontina recebia um benefício LOAS e que a depoente administrava o referido benefício; Que os dois
imóveis foram vendidos pelo valor de 1 (um) milhão de reais; Que a casa que foi entregue a depoente entrou no negócio pelo valor de
R$ 250.000,00 (duzentos e cinqüenta mil reais) e o carro no valor de R$ 46.000,00 (quarenta e seis mil reais); Que o João repassava o
valor de R$ 250,00 reais para a depoente para ser utilizado para alimentação da Sra. Leontina e o valor da empregada doméstica em
conta da depoente; Que o João arcava com outras despesas inerentes a Sra. Leontina; (....); Que o valor da venda dos imóveis não
foram depositados na conta da Sra. Leontina; Que a Sra. Leontina nunca participou da venda dos imóveis; Que a Sra. Leontina
atualmente sofre da doença mal do Alzheimer. Claudis Alves Barros (testemunha): Que o João não a ameaçou pessoalmente ou por
outro meio de comunicação; que ouviu uma gravação em que João afirma que se ele caísse derrubaria dois ou três; que tal gravação foi
destinada a Cledja; Que a Sra. Leontina afirmou a depoente que autorizou apenas a venda de um imóvel; O réu João Izidoro Alves, em
seu interrogatório, em apertada síntese, negou veemente a prática dos delitos imputados a ele. Sustentou que nunca ameaçou nenhum
de seus irmãos; Que vendeu os imóveis autorizados por sua genitora, Sra. Leontina Alves da Silva, ora vítima, apresentando documentos
de despesas e gastos em relação à referida vítima e de alguns irmãos. Importante frisar que as testemunhas e filhos da vítima, Claudionor
Izidoro Alves, Claudis Alves Barros, Cledja Alves da Silva e Cleonice Alves da Silva, ouvidos perante este Juízo, aduziram que atualmente
a Sra. Leontina Alves da Silva possivelmente sofre da doença de mal de Alzheimer, motivo pelo qual anda esquecendo-se de certas
coisas mais recentes. Compulsando atentamente os autos, observa-se que a venda dos referidos imóveis se deu no mês de setembro
de 2014, cujo valor foi de R$ 1 milhão de reais, tendo como sinal do negócio o recebimento de uma casa no valor de R$ 250.000,00
(duzentos e cinqüenta mil reais), sendo esta documentada e registrada em nome de Cledja Alves da Silva. Observa-se, ainda, que a Sra.
Leontina Alves da Silva, fora ouvida em uma ação de interdição, no dia 10 de maio de 2016 (págs. 1152/1153), na qual se apresentou
bem lúcida e afirmou a venda dos imóveis, bem como que seu filho João era quem administrava os bens dela. Desta forma, em apertada
síntese, ficou demonstrado nos autos, em tese, que o réu João Izidoro Alves negociou 02 (dois) imóveis de propriedade da Sra. Leontina,
com o consentimento desta, e tendo como destinação dos valores a aquisição de uma casa para sua filha Cledja, no valor de R$
250.000,00 (duzentos e cinqüenta mil reais), bem como a compra de um veículo para a mesma filha, além de inúmeras despesas
pessoais. Pois bem. É por demais sabido que o juízo de convencimento no processo criminal deve estar alicerçado em certeza, jamais
em probabilidades. A certeza pode, por sua vez, embasar-se não só em prova, mas também em indícios, desde que robustos e produzidos
na fase jurisdicional. No caso em tela, as provas produzidas na instrução processual não geraram o convencimento forte, tranquilo e
seguro neste julgador de que o acusado cometeu o delito em questão. Há, acima de tudo que se observar o princípio legal da presunção
da inocência. Ademais, em consonância com o disposto no art. 155 do Código de Processo Penal, entendo que as provas devem ser
produzidas durante a instrução processual, em contraditório judicial, sob pena de se infringir o princípio constitucional do contraditório e
da ampla defesa esculpido no art. 5o, LV, da Constituição Federal. Assim sendo, é que, como bem afirmou NELSON HUNGRIA, condenar
um possível inocente é mais traumático do que absolver um possível culpado, razão pela qual se impõe a absolvição do ora acusado no
delito em questão. DISPOSITIVO. Ante o exposto, com esteio no art. 386, VII, do Código de Processo Penal, por não existir prova
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º